27/06/2025

Governo usa transação tributária para viabilizar novo programa de saúde

Por: Danilo Vital
Fonte: Consultor Jurídico
Regulamentada desde 2020 e sucesso no âmbito federal, a transação tributária
é a aposta do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para viabilizar o
funcionamento do recém-lançado programa Agora tem Especialistas, criado
pela Medida Provisória 1.301/2025.
Transação tributária permitirá a hospitais privados trocar dívida por serviços
prestados a pacientes do SUS
O objetivo do programa é reduzir o tempo de espera por atendimentos no
Sistema Único de Saúde (SUS). E um dos meios para isso é credenciar hospitais
privados, filantrópicos ou não, para prestação de serviços de média e alta
complexidades: consultas, exames e cirurgias.
As instituições que aderirem terão condições especiais para obter a regularidade
fiscal, requisito do programa. Para isso, terão à disposição a transação tributária
por adesão.
E, uma vez que comecem a prestar serviços para usuários do SUS, poderão usar
os valores que receberiam para abater essas dívidas tributárias já transacionadas
a partir de janeiro de 2026.
Essa engenharia financeira foi construída pela Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional, em conjunto com a Secretaria Especial da Receita Federal. A previsão
é de que até R$ 2 bilhões sejam abatidos de créditos tributários em 2026.
Segundo a PGFN, o país tem cerca de três mil hospitais e clínicas com mais de
R$ 34 bilhões de dívida. Esse é o cenário que aumenta a confiança do governo
em ampla adesão. Para abater dívidas altas, será preciso atender a muitos
pacientes do SUS.
“A transação tributária é uma política pública lançada em 2020. Nós já fizemos
mais de três milhões de acordos. É uma política de regularidade fiscal que tem
confiança do contribuinte e das bancas de advocacia”, destacou a procuradorageral
da Fazenda Nacional, Anelize Almeida.
Em conversa com jornalistas, ela destacou as amplas vantagens oferecidas pela
PGFN para atrair os hospitais privados ao programa.
Como funciona
Para aderir ao programa Agora Tem Especialista, cada hospital precisa procurar
o Ministério da Saúde, onde será feita uma triagem inicial. Se a adesão for uma
possibilidade, o caso é encaminhado à PGFN para avaliar a regularidade fiscal.
A partir desse momento, será possível fazer a transação tributária por adesão,
via portal Regularize da PGFN, e a partir das informações pré-cadastradas. Essa
forma (por adesão), por ser mais ágil, é vista como trunfo pelo governo.
A partir do valor da dívida e da capacidade financeira de cada hospital, será
possível obter parcelamento com até 100% de desconto nos juros, multas e
encargos legais. Além disso, haverá descontos de até 70% no valor da dívida
principal.
Essas dívidas poderão ser pagas em até 145 meses (Santas Casas de
Misericórdia, cooperativas e organizações da sociedade civil) ou 120 meses
(demais casos).
Para quem aderir imediatamente, as parcelas até janeiro de 2026 terão valor
mínimo de 0,3% sobre o total negociado (após os descontos). Se a adesão for
feita a partir de outubro, o governo garante os três primeiros meses nessas
condições.
Transação tributária e pagamento
Em um exemplo hipotético, um hospital com R$ 1 milhão de dívida tributária
que obtenha 70% de desconto e adira ao programa começará a quitar o débito
pagando R$ 900 por mês. Posteriormente, o valor vai depender do número de
parcelas.
As primeiras parcelas são propositalmente baixas para permitir uma folga
orçamentária para essas instituições, que terão de se preparar para absorver um
número maior de pacientes ao prestar serviços para o SUS.
Cada consulta, exame ou cirurgia feito no âmbito do programa vai gerar créditos
atestados pelo Ministério da Saúde e que, a partir de janeiro de 2026, poderão
ser levados à PGFN para abater as parcelas da dívida ou tributos vencidos.
Se o valor amealhado por um hospital com pacientes do SUS for superior ao
valor da parcela fixada na transação tributária, por exemplo, será possível usar
o excedente para pagar tributos ordinários devidos à PGFN no mês de
exercício.
O programa ainda prevê a exclusão do hospital que atrasar seis parcelas —
prazo maior do que o praticado em programas de regularização fiscal. E ainda
assim a exclusão não será automática, mas após notificação para pagamento.
Sustentabilidade tributária
Segundo a procuradora-geral da Fazenda Nacional, a ideia é incentivar a
sustentabilidade tributária dos hospitais a longo prazo, considerando que o
programa Agora Tem Especialista vai durar até 2030 e as transações têm prazo
de até 12 anos.
“Não tem nada pior do que negociar uma transação e a empresa morrer na
praia. Eu preciso que o contribuinte tenha sustentabilidade para continuar
gerando recursos e tributos a pagar”, destacou Anelize Almeida.
Em sua análise, a forma como o programa foi gestado leva a transação tributária
a promover real impacto social. “Vamos converter crédito financeiro e passíveis
fiscais em prestação de serviço público.”
Anelize afirmou ainda que o limite anual de R$ 2 bilhões para créditos não gera
o risco de o programa ser encerrado prematuramente, como foi o caso do Perse
(para o setor de eventos), que atingiu o teto no último mês de março, com dois
anos de antecedência.
“Se pegarmos 100% dos hospitais com dívida e todos aderirem, com descontos
e parcelamentos, ainda assim R$ 2 bilhões nesse universo é muito crédito
financeiro. É suficiente para fazer todos os atendimentos. O crédito financeiro
não será um limitador.”